Advogado acusado de em conluio com juiz da causa movimentar mais de 70 milhões de kzs das contas bloqueadas sem processo judicial

Mais de 74 milhões de kwanzas foram movimentados das contas bancárias de oito membros da mesma família. Essas acções terão sido realizadas sob suposta ordem de um juiz do Tribunal da Comarca de Luanda, sem a abertura de um processo judicial. As transferências foram direcionadas para a conta de um advogado estagiário de nome Jovete Lázaro Cangoma Domingos, que alega ter prestado um serviço relacionado à venda de uma herança, o causídico nega as acusações.

Tudo começou em 2023, quando oito irmãos herdeiros decidiram reclamar pela herança deixada pelo seu pai Mário André Luamba, um antigo comerciante do ex-mercado Roque Santeiro, que faleceu em 2004, de forma repentina.

Segundo Edgar Futa Luamba, 30 anos, um dos filhos de Mário André Luamba, falando em nome dos irmãos, o seu pai durante a sua vivência como homem de negócio no então mercado do Roque Santeiro, em Luanda, terá deixado uma residência no Distrito Urbano do Sambizanga, dois (2) armazéns no Distrito do Hoji-Ya-Henda, município do Cazenga, e um armazém nos arredores na cidade de Malanje.

A “O Decreto”, os filhos revelam que, o seu progenitor deixou igualmente uma vivenda no centro da cidade de Malanje, bem como outro armazém no bairro Golfe 2, no município do Kilamba-Kiaxi, na capital do país, construído pelos tios com o dinheiro deixado pelo malogrado.

Todos esses bens, de acordo com os filhos, foram geridos sem transparência durante 20 anos, pelos irmãos do pai (Victor André Gonga Cumbissa e Adão André Luamba), em conluio com a mãe do falecido (a avó dos filhos), sem, no entanto garantir o benefício que devia aos filhos deixados pelo senhor Mário André Luamba, com a excepção de dois dos oito filhos, que teriam recebido algum apoio na formação até a conclusão da licenciatura.

“Os herdeiros mencionados acima foram vítimas dos seus familiares (avó e tios), que se apoderaram dos bens deixados pelo (de cujus) durante 20 anos, de forma intencional devido a sua ambição e ganância”, lamentam os filhos.

Venda dos bens

O ambiente familiar subiu de tensão, quando em Novembro de 2023, os tios decidiram vender o armazém do Hoji-Ya-Henda, sem adiantar o valor, um negócio que segundo Edgar Futa Luamba estava a ser feito com muito sigilo pelos seus tios, que contactaram apenas dois dos nove filhos, Adilson e Hermenegildo Luamba, respectivamente – garantindo-os 70 milhões de kwanzas.

O jovem de 30 anos conta que, o armazém em causa rendia para os tios de seis em seis meses, entre 15 a 16 milhões de kwanzas, valores cujo destino não era do conhecimento dos filhos.

Foi então que foi contratado um advogado estagiário Jovete Lázaro Cangoma Domingos, do escritório de advogados “Paulo Cardoso”, no município do Cacuaco, em Luanda, que recebeu em Novembro de 2023, a cédula de advogado nº. 1200397, passada pela Ordem dos Advogados de Angola (OAA), para que o mesmo facilitasse o negócio da venda do armazém do Hoji-Ya-Henda, no valor de 300 milhões de Kwanzas, a empresários chineses.

O pagamento do imóvel foi feito pelos chineses em quatro prestações de Dezembro de 2023 a Janeiro de 2024, altura em que o dinheiro caiu nas contas dos herdeiros.

“Porquanto, da acção do Dr. Jovete Domingos, que incluiu a mãe do de cujus e tios, não pertencente à 1ª linha de sucessão dos herdeiros legítimos (descendentes) na recepção dos valores resultante da venda de um armazém do património deixado pelo de cujus , alegando que 50% da herança pertence a mãe do de cujus”, contam.

Jovete Lázaro Domingos cobrou o valor de dois milhões de kwanzas para feitura de uma nova habilitação de herdeiros, mesmo já tendo uma habilitação de herdeiro, mas que alegou que era falsa.

Na sequência, o mesmo advogado estagiário, de acordo com os denunciantes, cobrou 55 mil kwanzas a cada um dos nove herdeiros para a feitura e custo da procuração.

“Colocou-nos em desentendimento na luta pelos bens, que quase criou inimizade entre os irmãos nomeadamente Edgar Futa Luamba e Adilson Luamba, tal acto que quebrou a confiança com o advogado Jovete Domingos”, lê-se numa exposição enviada a este portal.

De seguida os co-herdeiros decidiram contratar outro advogado, Paulo Costa, que ao aperceber da situação e da real intenção de Jovete Domingos que fez do bem em causa, uma parte do pagamento dos seus supostamente serviços prestados.

O advogado Jovete Domingos, não terá acatado o conselho do seu colega de profissão decidiu cobrar os seus honorários a qualquer custo – valor este de 24 milhões kwanzas, a qualquer custo.

Contas bloqueadas sem processo judicial

Após a transferência dos valores, os herdeiros depararam-se com o bloqueio das suas contas bancárias, sem nenhum processo judicial e posteriormente a movimentação das mesmas contas.

“O mais grave e revoltante é que os herdeiros, no fim de Janeiro e em Fevereiro de 2024, vimos nossas contas movimentadas sem o nosso consentimento mesmo estado com as contas bloqueadas (a partir dos aplicativos dos smartphones para a conta do advogado estagiário, num valor de a AKZ 74. 935. 043, 00, setenta e quatro milhões e novecentos e trinta e cinco mil e quarenta e três kwanzas)”, denunciam.

No dia 30 de Janeiro, na conta de Adilson Teixeira Luamba foram retirados 10 milhões, 927 mil e 709,24 kwanzas, no banco BIC 0051.0000.5947.2107.1412.0.

Dia 6 de Fevereiro deste ano, foi a vez da conta de Hermenegildo Teixeira Luamba, no Banco BAI: 0040. 0000.3115 7753. 1018.3, o valor de 40 milhões, 812 mil e 699 kwanzas.

No mesmo dia 6 de Fevereiro, foi retirada da conta de Maira da Costa, um total de 4 milhões, 400 mil e 013 kwanzas, do Banco BAI: 0040.0000.4551.1095.1010.4.

Ainda no dia 6 de Fevereiro de 2024, Márcia da Costa viu movimentada a sua conta domiciliada no Banco BAI: 00400000.1044.3973.1019.6, um total de 18 milhões, 789 mil e 80 kwanzas.

“Constas feitas, foram transferidas 74 milhões, 935 mil e 044 kwanzas, para a conta do advogado estagiário Jovete Lázaro Cangoma Domingos”.

Os filhos herdeiros denunciam ainda que “o advogado Jovete Domingos, fez em Dezembro de 2023, sob forma de notificação avulsa, que não nos chegou a primeira nem a segunda, mas sim a terceira notificação com ameaças de morte e prisão – no mês seguinte, constatamos de forma estranha com o bloqueio das nossas contas bancárias no dia 12 de Janeiro de 2024”.

Posto aos referidos bancos, os herdeiros foram informados que as contas estão bloqueadas porquanto do processo 265/23 – A/TPLDA, ordem do ofício proveniente da 17ª Secção das Sala dos Crimes Comuns do Tribunal da Comarca de Viana, referências 09/17ªSSCCT/TCL/2023 e 10/17ªSSCCT/TCL/2023.

Segundo apurou O Decreto de uma fonte do tribunal, o referido processo nada tem haver com a causa em questão, correspondendo abuso sexual, cujo acusado é um cidadão identificado apenas por Pedro, que os filhos desconhecem e que em algum momento foram emitidos ofícios para os bancos, “tais ofícios cheios de vícios”.

Processo-crime contra advogado estagiário

Diante da gravidade dos factos, avançam as vítimas, “os herdeiros não tiveram hipótese, se não despoletarem o competente processo crime contra o advogado estagiário, Jovete Domingos, cujo processo n.º 709/024-05 corre trâmites em fase de instrução preparatória no Serviço de Investigação Criminal (SIC) e na Procuradoria-Geral da República (PGR) n.º 681/024.

“O instrutor do SIC, que nos passou a informação de que, depois de se fazer a diligências nos bancos (ofícios para bloquear a conta do advogado e para pedir o extrato bancário do mesmo advogado), no extrato bancário apareceu que este mesmo advogado dividiu o dinheiro com o Lando Paulo Miala, Venâncio Ngkula Zau da Conceição mais conhecido por ´Dudu` – o homem que nos trouxe o advogado Jovete Domingos, estes dois são intermediários do nossos tios, juntamente com os tios e mais dois desconhecidos”, denunciam os filhos.

Foi apresentada igualmente uma participação contra o referido advogado na Ordem dos Advogados de Angola (OAA) sobre o sucedido com vista à abertura de um competente processo disciplinar.

Devido ao bloqueio das contas, os herdeiros afirmam que passam por muitas dificuldades, dada a situação econômica, pois ficaram privados dos recursos financeiros, agastados para sobreviver e impossibilitados de movimentar as suas contas bancárias.

No dia 24 de Janeiro, o jovem Edgar Futa Luamba disse ter perdido a sua mãe Joana Rodrigues Bernardo Futa, alegadamente por falta de meios financeiros para prosseguir com o tratamento médico.

“Até agora as nossas contas continuam bloqueadas. Estamos a passar por muitas dificuldades, pois tem irmãos que estudam e correm risco de parar com o estudo e outros vivem em casas de renda, e sem a possibilidade de pagar para além de uma das irmãs estar grávida prestes a dar à luz”, lamentam.

Os filhos apelam aos órgãos de direito a agirem nos marcos da lei, com vista a repor a legalidade e a preservação dos seus direitos, enquanto filhos legítimos do malogrado Mário André Luamba.

Advogado nega acusações

Para o cruzamento dos factos, O Decreto contactou o advogado acusado, que negou todas as acusações.

O causídico que não aceitou ser identificado, disse conhecer o caso, mas esclareceu que os filhos de Mário André Luamba estão alegadamente a agir de má-fé e que o bem em causa não é uma herança deixada pelo seu pai falecido em 2004, “mas sim da avó – a mãe do pai deles”.

O advogado disse que, na altura em que foi contratado para prestar os serviços, assinou-se um acordo para o pagamento dos seus honorários no valor de 24 milhões de kwanzas, e que ninguém discordou desse valor.

Na sua reacção, o advogado explicou que em nenhum momento cobrou dois milhões de kwanzas para a feitura de nova habilitação de herdeiros, pois o dinheiro saiu do seu bolso, uma vez que filhos não trabalham, por isso ninguém tinha a possibilidade pagar os valores em causa.

Revelou ainda que os 55 mil kwanzas pagos para a feitura da procuração saíram igualmente da sua conta e não dos reclamantes.

O advogado fez notar que o dinheiro estava nas suas contas por “roubo”, pelo que teve de mover um processo-crime na 17ª Secção dos Crimes Comuns do Tribunal da Comarca de Viana, “após a notificação avulsa contra eles”, uma vez que não aceitaram pagar os honorários conforme acordado.

O advogado sublinhou que o Tribunal da Comarca de Viana ordenou a transferência dos valores, de acordo com o termo de quitação, que são: 24 milhões do advogado, 15 milhões dos intermediários e 34 milhões da mãe do malogrado, que segundo o causídico “é a dona do armazém vendido a 300 milhões de kwanzas”.

Segundo ele, nenhum advogado tem a competência de retirar dinheiro nas suas contas ou bloquear as mesmas. “Se as contas foram bloqueadas foi por ordem do Tribunal e não do advogado”, disse.

As contas encontram-se em nome de Hermenegildo Teixeira Luamba, Germano Teixeira Luamba, Isabel da Costa Luamba, Márcia da Costa Luamba, Samira Teixeira Luamba, Maira da Costa Luamba, Adilson Teixeira Luamba e Maura Lopes Luamba.

O Decreto